O reinado de Thomas Shelby em Peaky Blinders | Iradex

O reinado de Thomas Shelby em Peaky Blinders

Por ordem dos Peaky Blinders, o texto abaixo não possui spoilers!

“Eu não sou Deus… Ainda”. É com essa frase que Thomas Shelby termina o primeiro episódio da quinta temporada de Peaky Blinders. A série da BBC está de volta, depois de quase dois anos ausente, e com menos de um mês da exibição do fim da nova temporada, os episódios já estão disponíveis na Netflix Brasil. A produção já foi indicada no Iradex Podcast, então fica aqui a recomendação para ouvir esta edição e saber mais detalhes e curiosidades da obra. Além disso, já demos um panorama geral da série neste texto.

A história da gangue de Birmingham que começou em 1919, logo depois do fim da Primeira Guerra Mundial, chega agora a 1929, com a quebra da bolsa de valores de Nova York e o surgimento do fascismo que levou a Europa em direção a sua Segunda Guerra. E no meio disso tudo está Thomas Shelby (Cillian Murphy), líder dos Peaky Blinders, líder da Companhia Shelby, e membro do parlamento britânico. O descendente de ciganos que no início só tinha seu precioso cavalo e a ideia de expandir os negócios, e agora tem carros, casas, e poder. Tommy percorreu um tortuoso caminho e chegou mais longe do que esperava chegar. Mas este é o início de seu inevitável fim.

O arquétipo de um personagem como Thomas Shelby não é nada inédito. Ele representa o protagonista com um código moral duvidoso, que busca a ascensão a uma posição de maior relevância, e não hesita em cometer crimes para cumprir seu objetivo. A televisão viu isso recentemente com Walter White, de Breaking Bad, e anteriormente com Tony Soprano, de Os Sopranos. O chefe da família que diz agir a fim de proteger aqueles que ama, mas cujo interesse próprio acaba prevalecendo no final. Eles, no entanto, não são personagens unidimensionais, e é justamente o fato de seres protagonistas moralmente dúbios que tanto atrai o interesse do público. Figuras heroicas, que sabem exatamente o que é certo ou errado, e lutam para que o “bem” prevaleça, o que quer que isso signifique, são geralmente os protagonistas das histórias que consumimos, e por isso, muitas vezes, são os vilões que ganham mais atenção do público.

Vilões não estão preocupados com se devem ou não cruzar a linha do que é dito como certo ou errado, eles agem de acordo com seus interesses, e, geralmente, são extremamente charmosos. Eles possuem as roupas mais estilosas, as armas mais diferentes, discursos impactantes. Em diversas histórias, os vilões se tornam os personagens favoritos do público. Eles também quase sempre querem causar a destruição global ou “apenas” matar milhares de pessoas? Sim. Então como equilibrar um senso de justiça com a cruzada do interesse pessoal acima de tudo e todos?

Quando conhecemos Thomas Shelby na primeira temporada de Peaky Blinders, vemos alguém traumatizado pela experiência brutal da guerra. Alguém que uma vez foi feliz, e sorria, e depois mal consegue dormir e está preso em um poço de melancolia. Vários de seus amigos se foram, e o que resta agora é focar em expandir os negócios da família. Sair da sombra da fumaça industrial que cobre Small Heath e se sentar nos mesmos bancos da alta sociedade que vê a classe de Tommy como escória. Seja para tirar os seus da pobreza ou simplesmente para mostrar que pode alcançar o que quiser, Tommy não mede esforços para deixar a vida de líder de uma gangue que trapaceia em apostas de corridas de cavalos para se tornar um empresário, dono de uma companhia legítima, que só comete crimes quando extremamente necessário. Não muito diferente daquela alta sociedade mencionada anteriormente, e nem mesmo dos mais nobres políticos do Parlamento.

Tommy mata? Sim, mas ele tenta ao máximo possível não fazer isso. Ele impõe regras, e se os que seguem seu comando não as cumprem, o que lhe resta fazer? Não se chega a um posto de liderança como esse sem manter uma rédea firme. Tommy negocia e mantém relações perigosas com criminosos? Claro, afinal o melhor caminho rumo ao sucesso é aquele que ninguém mais está tomando. Tommy vê oportunidades onde outros veem obstáculos e é isso que o fez chegar tão longe. Mas acima de tudo, Tommy lida com o remorso de ter sobrevivido não somente aos companheiros de guerra, mas a todos aqueles que morreram por consequências de suas ações; lida com a culpa de ainda precisar reverter a ações indignas; lida com o conflito entre agir em prol de seu reinado ou em prol do bem maior; e mais do que tudo, lida com a dor de ser humano.

Por seu tão bem escrito, e interpretado espetacularmente por Cillian Murphy, Thomas Shelby é o protagonista perfeito para quem quer mais do que a nobreza do herói e o egoísmo do vilão. Ele é o líder nato em busca da recompensa que lhe é justa, e ele não irá hesitar em colocar as mãos na lama para conquistá-la. Tommy guia seus seguidores, e seu público, com cada olhar, cada gesto e cada palavra, todos meticulosamente calculados para causar o efeito desejado. Mas depois de 10 anos, Tommy apostou alto demais no jogo, e agora deve fazer o possível para não perder tudo.

Os Peaky Blinders já sobreviveram à inveja de gangues rivais, à “justiça” da força policial, à vingança da máfia, e à altivez de políticos. Agora eles têm de combater uma das piores ameaças que já tiveram de enfrentar: eles mesmos. Chegou a hora de deixar os tempos de gangue de navalhas da rua de trás, e se tornar algo… Maior. Ainda está a se revelar o que o futuro reserva ao reinado de Thomas Shelby, mas uma verdade ainda se mantém: Não mexa com os Peaky Blinders.

A quinta temporada de Peaky Blinders conta com os retornos de Polly (Helen McCrory), Arthur (Paul Anderson), Michael (Finn Cole) e Ada (Sophie Rundle), além de vários outros personagens recorrentes da série. As novas adições incluem Anya Taylor-Joy como a namorada de Michael e Sam Claflin como Oswald Mosley, o membro do parlamento que defende o fascismo no governo britânico. A temporada tem uma direção excelente de Anthony Byrne, com roteiro do criador e showrunner Steven Knight. A trilha sonora agora está nas mãos de Anna Calvi, que acompanha cada estado de espírito de Tommy com composições belas e inquietantes. Entre as músicas da temporada, estão Atmosphere do Joy Division, The Wizard e War Pigs do Black Sabbath, e Climbing Up The Walls do Radiohead. Peaky Blinders está no auge de sua audiência no Reino Unido, e a rapidez com que a quinta temporada chegou na Netflix Brasil é um ótimo sinal para o nosso público. É estimado que a produção continue por mais duas temporadas, então certamente esta não é última vez que você verá o nome dos Peaky Blinders no Iradex.