Algo tem acontecido desde mais ou menos 2016: a aparente reabertura dos portões das adaptações para cinema e TV de obras do Stephen King. Um fluxo de produções que não era visto desde os anos 70 e 80. Não que as adaptações tenham parado em algum momento (Hollywood sempre está atrás de obras pra adaptar, e Stephen King simplesmente se recusa a parar de escrever), mas as que têm saído nos últimos anos têm feito mais barulho, pro bem ou pro mal. Enquanto A Torre Negra e O Nevoeiro foram decepções, It - A Coisa, Jogo Perigoso e Castle Rock foram bem recebidos. Essa semana estreia a mais nova dessas adaptações, Cemitério Maldito.
O filme conta a história da família Creed, um casal com duas crianças, que acabou de se mudar para o interior do estado americano do Maine (onde se passam a grande maioria das histórias de King) para ter uma vida mais tranquila. Logo, eles descobrem que em seu novo quintal, no meio da floresta, há um cemitério de animais, o que já seria assustador o suficiente, não fosse o adicional de que, além do cemitério, também há um pedaço de terra que faz com que qualquer ser morto ali enterrado volte à vida. Além disso tudo, eles ainda vivem na beira de uma estrada movimentada, então já dá pra ter uma ideia do que esperar.
Apesar de ser bem óbvio que a parte assustadora do filme virá de algo que volta dos mortos, pode ser uma surpresa perceber que são apresentados outros elementos de terror - principalmente visões de espíritos, alucinações e uma parte que se aproxima muito dos filmes de slasher. Talvez tais partes não sejam novidade para quem já leu o livro ou já viu a outra versão em filme dessa história (feita em 1989 e que fez sucesso na época), mas pros olhos despreparados pode ser uma surpresa.
Essa variedade de “recursos assustadores” me faz não saber muito bem o que achar do filme como um todo. As atuações são satisfatórias e é construído um clima tenso bem interessante (destaque para a cena prenunciativa logo no início do filme), assim como todo o drama da virada que acontece do segundo para o terceiro ato. No entanto, existe um excesso de informação. São desnecessárias, e até mal explicadas, principalmente as visões que Louis (Jason Clarke, sósia do Rick de Walking Dead), o pai da família, tem - apesar de bem filmadas. Também há o destaque à infância de Rachel (Amy Seimetz), a mãe, que apesar de ter importância ao desenvolvimento da história e da personagem, acaba ficando meio deslocado do resto.
A parte final do filme, que flerta com filmes de serial killers mais tradicionais não me agrada muito, trazendo uma ação que, mesmo fazendo parte da construção da história, poderia ser melhor realizada. A pouco tempo vimos Nós, de Jordan Peele, que tem cenas similares feitas de maneira mais interessante e conversando de maneira mais natural com o resto do filme.
Na parte visual, a fotografia e a construção dos cenários agradam, principalmente das cenas na parte mais profunda da floresta, que além da bizarrice natural de uma floresta a noite, também tem pequenos elementos de intervenção humana que dão mais profundidade ao lugar. Também há os efeitos práticos, como a maquiagem de certos personagens e toda a expressão corporal de outra, que dá ao filme uma porçãozinha de body horror que aprecio muito.
No fim, mesmo em tempos de polarização de opiniões, não consigo ser muito extremo para nenhum lado em relação a Cemitério Maldito. Ele faz o que se propõe, mas tem seus altos e baixos e prevejo que vai dividir o público assim como dividiu a mim.