Por Guilherme Lourenço
Existem diversos momentos na vida adulta em que nos questionamos sobre a felicidade e nossa verdadeira vontade de sermos quem ou aquilo que realmente desejamos. Porém, para isso muitas vezes é necessário encarar alguns demônios internos e esqueletos no armário, enfrentando até mesmo aqueles que nos querem bem. Nesse caminho, a coragem é ferramenta fundamental para reestabelecer bases e princípios onde os alicerces das novas posturas serão assentados. Justamente coragem foi o que não faltou para a jornalista Jeannette Walls ao escrever suas memórias no best-seller que dá origem ao filme homônimo, “O Castelo de Vidro”.
Dirigido por Destin Daniel Cretton, a história trata da conturbada relação entre Jeannete, vivida pela ganhadora do Oscar Brie Larson, e sua família disfuncional, capitaneada por seu excêntrico pai (Woody Harrison) que tenta estimular os filhos através da imaginação para encarar a pobreza.
A situação é mais peculiar e delicada do que enfrentar a escassez econômica e alimentar, visto que a origem da maioria dos problemas está justamente naqueles que deveriam evitar ou resolvê-los: os pais.
A mãe de Jeannete é vivida por Naomi Watts, que interpreta uma artista plástica frustrada. Logo no início da trama, sua negligência permeada por um certo egoísmo, acaba dando oportunidade a um acidente que deixará marcas profundas na personalidade de sua filha. Na sequência do fato, vemos o plano irresponsável do patriarca para retirar a menina do hospital sem que a família tivesse problemas com a assistência social.
A partir deste momento Woody Harrison mostra que se especializou em viver personagens desajustados, apresentando um carismático pai que possui uma visão inconformada do mundo, ao ponto de não permitir que seus filhos frequentem uma escola regular e sonhando em construir um castelo de vidro para eles.
Neste aspecto, não há como não lembrar de “Capitão Fantástico”, principalmente pois duas crianças atuam em ambos os filmes. Porém o verde da mata e a luz e calor do sol, que permeia o filme estrelado por Viggo Mortensen, não conseguem penetrar na parede de vidro deste castelo opaco, onde o álcool, a falta de emprego fixo e as intempestivas brigas levam a família a fome e insalubridade. A atuação de Harrison é intensa, sem exageros, permitindo que a audiência sinta a mesma compaixão, carinho, medo e revolta que a jovem Jeannete (Ella Anderson)
É provável que seja lembrado em algumas premiações e que, se o filme fosse lançado mais tarde, poderia ser um dos candidatos a indicação ao Oscar.
Definitivamente as atuações são um ponto forte. Brie Larson demonstra a segurança e tranquilidade de quem está fazendo um belo trabalho, mesmo quando vive a fase adolescente de Jeannete, onde seu porte físico em alguns momentos parece incompatível com a idade. Ella Anderson também nos entrega um ótimo expediente, lembrando que possui mais tempo de tela que a ganhadora do Oscar, vivendo a protagonista quando criança.
As idas e vindas entre as diferentes fases da família são de se esperar em um filme baseado em autobiografia, porém talvez o maior problema da película seja o roteiro e montagem, já que muitas vezes não sabemos em que momento estamos e nem lugar, deixando para trás algumas explicações de como as crianças conseguiram se arrumar para resolver suas vidas.
Definitivamente não é razão para deixar de conferir um belo exemplar de drama, que nos entrega uma certa dose de amor incondicional, luta pela sobrevivência e perdão.