Guro Station #02 - Tetsuo: The Iron Man, de Shinya Tsukamoto

  Olá, criaturas terrestres apodrecidas de tripas, fezes e ambições capitalistas.

Novembro já dá seus últimos suspiros e, antes que pudéssemos recuperar nossos bolsos da Black Friday, o calendário segue com os tão esperados festejos natalinos. Ah, o Natal!... Infelizmente o que nos resta, diante de um cenário pré-apocalíptico de pandemia, são as reuniões familiares em casa e a boa e velha maratona de filmes de Natal...

... No entanto, se você está sintonizado aqui, na frequência do Guro Station, provavelmente se interessaria em fechar este mês com chave de fenda enferrujada bem no meio do olho direito enquanto o esquerdo assiste um homem assalariado japonês estuprar a suposta namorada com uma mola gigante - que no caso, seria seu pênis.

Então fiquem ligados para os próximos blocos.

Uma modalidade cyberpunk e dadaísta de fetiche sexual doentio, jamais catalogado em qualquer site de conteúdo adulto, é introduzido em Tetsuo: The Iron Man, filme de 1989. Dirigido e estrelado por Shinya Tsukamoto, a experiência lunática de 67 minutos mistura técnicas de stop motion com gore pesadíssimo e uma trilha sonora experimental, obviamente para gerar repulsa no expectador, mas não apenas isso. Outra mensagem é comunicada: um protesto ao futuro regido pelas máquinas literalmente fudendo com a vida da sociedade japonesa. Não é a toa que foi considerado um divisor de águas dentro do movimento cyberpunk japonês.

Por ser demasiado caótico, o enredo do filme parte de suposições dos acontecimentos. Tudo começa quando um rapaz é atropelado por um homem denominado "assalariado" acompanhado de sua suposta namorada, e utiliza um implante de ferro na lesão provocada. Então, o metal domina seu corpo de tal forma a torná-lo um receptáculo da "entidade máquina" - o que aparenta ser um "vírus" capaz de devorar a consciência humana. Não bastando ter se livrado do corpo da vítima, o assalariado, após cortar-se com um barbeador, logo é atormentado por sonhos dementes e, muito mais seriamente, por uma metamorfose gradual a uma pilha viva de sucata.

Em meio a este enredo, Tetsuo ainda apresenta um potencial alerta para imagens sensíveis em vista da violência sexual perturbadora do assalariado para com sua namorada. Não há justificativa acerca da "alucinação maquinária" suficiente para acobertá-lo, seja com um pau de carne ou um pirocão de cano. Como mulher, confesso que me senti incomodada com a provável mensagem subliminar que acoberta a culpa do estuprador. Ou posso só estar polemizando demais em cima de um filme doido...

Deixando de lado os alguns desgostos pessoais, a obra audiovisual apresenta características interessantíssimas: a acessibilidade de comunicação mesmo contendo basicamente uma a duas linhas de diálogo, a trilha sonora explosiva criada a partir de percussão de metal e sintetizadores, uma clara crítica à relação homem/máquina - que aponta para certas coincidências de roteiro ao clássico do cyberpunk japonês Akira, cujo personagem "xará" do nosso homem de ferro também torna-se um "homem-máquina" vítima de conflitos psicológicos internos e deformação corporal.

Tetsuo: The Iron Man e suas sequências Tetsuo II: Body Hammer (1992) e Tetsuo: The Bullet Man (2009) são clássicos do gênero experimental cult essenciais para iniciar o clima natalino com todo o gás. Se você resistiu até os últimos segundos desta transmissão, obrigada por permanecer sintonizado conosco, querido ouvinte.

Saudações da sua estação de rádio favorita, Guro Station.