“A separação entre humano e robô talvez não seja tão significante quanto a divisão entre inteligência e falta de inteligência.”
Isaac Asimov.
Com certeza você já se deparou com esse nome em algum momento da sua vida. Talvez em vários. Tudo que você ouviu a respeito desse simpático senhor que tinha medo de voar e adorava lugares apertados ainda é pouco frente à sua grandiosidade e importância para a história da ficção científica e para o desenvolvimento da humanidade.
Nascido em janeiro de 1920 em uma pequena aldeia na antiga URSS (mais precisamente na fronteira entre a Rússia e Belarus), logo cedo Asimov se mudou com sua família para os Estados Unidos.
Tendo aprendido a ler sozinho aos cinco anos, cedo se apaixonou pela ficção científica, devorando todos os livros (seu preferido era Frankenstein, de Mary Shelley) e revistas (a Astounding Science Fiction muito o empolgava) que conseguia esconder de seu pai, um judeu ortodoxo julgando tudo aquilo como uma grande besteira.
PhD em bioquímica, o Bom Doutor (como seus colegas e alunos carinhosamente o apelidaram) conciliou sua carreira científica com a de escritor. Utilizava seus livros para divulgar conhecimentos científicos modernos da época e para fazer suas próprias previsões do futuro (são mais de 500 publicações, entre ficcionais e técnicas).
Considerado por muitos como o melhor escritor de ficção científica de seu tempo (segundo ele próprio, esse título era de Arthur C. Clarke), teve influência direta em toda uma geração de grandes escritores como Philip K. Dick (Blade
Runner) e William Gibson (Neuromancer), bem como de cientistas; o astrônomo Carl Sagan, responsável pelo projeto Voyager, declarou várias vezes que ele era seu autor preferido.
Sua Trilogia da Fundação é tida por muitos como o “Senhor dos Anéis da Ficção Científica”. Um de seus contos, Ao Cair da Noite (Nightfall) foi eleito o melhor conto de ficção científica de todos os tempos (apesar de o conto ser fantárdigo, acho que esse prêmio tinha que ser no mínimo tripartido com outros dois contos: Profissão e A Última Pergunta; ambos podiam ser encontrados no livro Nove Amanhãs, que infelizmente está esgotado). Até uma cratera em Marte leva o seu nome!
Ao falecer em 1992 (em decorrência de complicações devido ao vírus da AIDS, contraído em uma transfusão de sangue durante uma cirurgia), Isaac Asimov nos deixou como legado a sua obra e sua confiança no poder criativo do ser humano.
Os Robôs e as Leis
O primeiro contato de Asimov com os robôs foi através da peça teatral R.U.R. (Rossum’s Universal Robots), em que o personagem principal, Rossum, criava seres artificiais para fazer o trabalho braçal e assim deixar os homens livres para fazerem o que bem entendessem.
O impacto que R.U.R. teve em Asimov foi grande, pois o fez questionar como o homem poderia criar algo aquém do seu controle (na peça, os seres artificiais se rebelam contra os humanos). Essa e outras histórias da época tinham a característica de a criatura se virar contra o criador, o que ficou conhecido como “Complexo de Frankenstein”.
Por isso, logo que começou a escrever suas primeiras histórias, Asimov pensou em um modo de fazer com que o homem pudesse dominar suas criações. Foi aí que surgiram as famosas Três Leis da Robótica (o termo “robótica” é reconhecido como uma criação de Asimov, apesar de o termo “robô” já existir na época, derivando da palavra tcheca robota, que significa “escravo”), assim enumeradas:
1ª lei: Um robô não pode ferir um ser humano ou, por inação, permitir que um ser humano sofra algum mal.
2ª lei: Um robô deve obedecer às ordens que lhe sejam dadas por seres humanos, exceto nos casos em que tais ordens contrariem a Primeira Lei.
3ª lei: Um robô deve proteger sua própria existência, desde que tal proteção não entre em conflito com a Primeira e Segunda Leis.
A partir dessas Três Leis, Asimov construiu toda sua literatura de robôs. Seu primeiro conto publicado se chama Robbie, mas as Leis aparecem pela primeira vez no conto Brincando de Pique, Runaround no original (ambos podem ser encontrados no livro Eu, Robô).
A mesma revista que o introduziu à ficção científica, a Astounding Science Fiction, publicou centenas de seus contos abordando os mais variados temas, indo desde robôs que não obedeciam a uma das Leis (O Pequeno Robô Perdido, Little Lost Robot), até robôs que começavam a ter sentimentos humanos (Sonhos de Robô, Robot Dreams).
Cavernas de Aço, primeiro romance e publicações brasileiras
O diretor da Astounding, John Campbell, insistia com Asimov que os contos eram muito bons, mas que ele precisava escrever um romance sobre robôs. Foi então que o Bom Doutor resolveu ousar e teve a ideia de escrever uma história misturando a ficção científica e o romance policial. O resultado disso foi o primeiro livro da Trilogia dos Robôs, As Cavernas de Aço (The Caves of Steel).
O enredo é aparentemente bem simples: um assassinato, um policial linha dura, uma investigação cheia de percalços. Mas por trás do clichê dos romances policiais, Asimov levanta questões de extrema profundidade e complexidade.
Sua visão de um mundo onde as pessoas vivem trancafiadas em enormes cidades, verdadeiras cavernas de aço, sem nenhum contato com o mundo exterior, deixando o trabalho ao ar livre para os robôs, é bastante perturbadora justamente por ser plausível.
Todas as características do Asimov contista estão presentes nesse romance: narrativa fluida, diálogos diretos, personagens caricatos, e um final de cair o queixo. Se quisermos, podemos chamar o Cavernas de Aço de um “contão”.
Publicado em 1954, quando Asimov já era bem conhecido no meio Sci-Fi, por causa de sua Trilogia da Fundação, o livro foi um sucesso absoluto, e até hoje é o seu trabalho mais vendido.
Aqui no Brasil ele foi publicado na década de 80 pela antiga editora Hemus, que teve a infeliz ideia de mudar seu título para Caça aos Robôs (não me pergunte por quê). Há muito tempo esgotado, essa obra tão importante foi reeditada recentemente pela Editora Aleph, com acabamento belíssimo, tradução magistral e, o melhor, o título correto!
Esperamos que a Aleph em breve publique as duas outras partes da Trilogia dos Robôs que estão atualmente esgotadas. São elas The Naked Sun, que a Hemus publicou como Os Robôs; e The Robots of Dawn, publicado como Os Robôs do Amanhecer, agora pela Record (dessa vez acertaram!).