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Lugares Distantes | Caça Aos Fatos

Existem aqueles que viajam para relaxar ou turistar; trabalhar ou estudar; explorar ou se aventurar; se descobrir ou adquirir conhecimento; amar ou fazer amigos; ajudar ou ampliar visões de mundo.

O renomado cronista Andrew Solomon (O Demônio do Meio-Dia; Longe da Árvore) viaja para dar coragem ao garotinho assustado que foi na infância. Americano de família judia criado em Nova Iorque se tornou cidadão do mundo ao escrever para as revistas The New York Times e Travel + Leisure conhecendo 83 países de maneiras diferentes, da Antártida a China entre culturas ocidentais e orientais.

O contato com artistas e ativistas; ex-prisioneiros políticos e vítimas de guerra, xamãs e monges; junto a experiências marcantes em sociedades populosas até as tribos mais remotas são compiladas e revisadas na coletânea de ensaios "Lugares Distantes: Como viajar pode mudar o mundo".

Seus relatos e andanças não programados de lugares específicos em momentos específicos da história contemporânea demonstra como países e governos podem ser alterados por indivíduos. Ler sobre cada transformação social ou hábitos que esclarecem comportamentos culturais tão diferentes dos nossos pelas palavras de Solomon é viajar sem sair do lugar. Nos conectando aos olhos e sentimentos de pessoas comuns em lugares extraordinários através de uma escrita que demonstra compaixão genuína.

Se crônicas dedicadas a arte "moderna" chinesa ou restrições a liberdade expressionista russa podem parecer enfadonhas e uma leitura pesada, são fascinantes: o contato com aldeia na Indonésia onde a surdez congênita formou cultura não excludente e formas de comunicação; bem como um tratamento anti depressão nada convencional "nu, coberto de sangue e tomando uma coca-cola" no Senegal.

As dolorosas marcas de guerras civis em Ruanda, Camboja, Líbia e Mianmar são abordadas escutando vozes que se ergueram, como Aung San Suu Kyi, e respeitando os que se calaram. Nessa temática, a visita ao Afeganistão em 2002 após o atentado de 11 de Setembro constata entre as ruínas de Cabul causadas pelos bombardeios do Talibã, uma surpreendente comunidade artística exuberante e otimista.

Locais que buscam a paz como o Rio de Janeiro, visitado em 2011 e 2014, na "onda de esperança" pós pacificação de favelas e pré Copa do Mundo e Olimpíadas. O autor faz retrato profundo e preciso das mazelas sociais entre a pista e o morro. O cotidiano carioca de violência em que "balas perdidas" matam de crianças a vereadoras. Tristemente os "jogos da exclusão" continuam na cidade maravilhosa.

A abertura social da China é constatada ao fazer tour gastronômico décadas após a primeira viagem. A sofisticação na cultura culinária tem contraponto na poluição do solo e água fazendo que alguns produtos alimentícios sejam prejudicados; aumentando fast-foods ocidentais, alimentos processados e obesidade.

Essa globalização é observada em outros destinos, como: a Zâmbia que virou concorrido destino turístico; o litoral turco na costa leste do Mediterrâneo; o nomadismo e comunismo que diminui na Mongólia. Por fim, uma tripulação "Torre de Babel" frustrada rumo as geleiras da Antártida e uma situação limite vivida na Austrália mostram que viajar também é enfrentar o inesperado... e sobreviver.

Um livro atemporal que pode ser lido fora de ordem, pausadamente e levado na mochila inspirando um olhar curioso e empático sobre o mundo próximo e lugares distantes. Pois viajar é abrir-se para fora.

Assistir a um mundo global é um meio de fazer um mundo global. O internacionalismo é complicado e confuso, fonte de conflito tanto quanto de paz, mas ao viajar e receber viajantes estaremos favorecendo a justiça. Acreditando que não podemos ser cidadãos do mundo, perderemos o mundo do qual poderíamos ter sido cidadãos.

Lugares Distantes: Como viajar pode mudar o mundo

Andrew Solomon; Companhia das Letras; 584 páginas; 2018.

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