Primeiros Segundos #18 - Por dentro | Iradex

Primeiros Segundos #18 - Por dentro

Pegue um pão quentinho, com a casca bem crocante. Corte ao meio e passe uma camada generosa de cream cheese. Em um grande copo, misture o leite com o achocolatado.

Sente na sala, ligue a TV e aprecie um... qual será o grande clássico de hoje?

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Texto, locução e edição por Mackenzie Melo. Participação especial: Gusta Mociaro e Bruno Garcia


Por dentro (versão em texto)

“Eu fui ferido e agredido e não consegui dizer o que senti
Estava irreconhecível, até para mim mesmo
Eu vi meu rosto em uma janela e não me reconheci
Meu irmão, você vai me deixar aqui, definhando
Nas ruas da Philadelphia?”

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Seja bem-vindo a mais um Primeiros Segundos. Eu sou Mackenzie Melo. Espero que aprecie a vista e a audição deste episódio. Também espero que não esteja ouvindo no trabalho pois, antes de terminar de ouvir, o chefe vai chegar e se era para você estar trabalhando... Bom, torço para que eu não tenha causado nenhum problema.

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“Algumas vezes eu acho que sei
O que realmente é o amor
E quando eu vejo a luz
Sei que ficarei bem”

Saber uma coisa não significa saber fazer aquela coisa. Uma melhor maneira de dizer isso talvez seja dizer que conhecer a estrada não é o mesmo que trilhar a estrada.

Nós somos sempre os outros.

- Mackenzie dessa vez está certamente com problemas. (Posso quase ouvir você pensando...) Não é possível que isso que ele está dizendo possa fazer realmente algum sentido...

Eu sei que estou divagando e, talvez, realmente caminhando por estradas complexas e sem muito sentido para você. Por isso peço um pouco de paciência. Adoraria que você pudesse continuar ao meu lado por alguns minutos para ver se o que eu estou escrevendo tem sentido. Naturalmente que não espero concordância, mas se seguir junto comigo, prometo fazer com esses minutos sejam, ao menos, divertidos. Eu sempre me divirto ao ouvir pessoas falando coisas que não fazem sentido para mim. (Mesmo que tenha sentido para elas...). Então podem rir de mim. Sem problemas.

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Um tempo atrás, quando pensei em preparar mais um episódio do PS, escolhi um podcast sobre o qual iria falar e criei um arquivo onde escreveria sobre ele quando chegasse o momento. Enquanto o momento não chegava, fui ouvindo outros, muitos outros podcasts.

O podcast que escolhi naquele dia foi Inside Jaws, ou seja, Por dentro de Tubarão. Não, não é sobre virar comida de tubarão. É sobre o filme de Steven Spielberg mesmo. Só que não é esse o podcast que vou indicar. Quer dizer, é sim, mas não apenas ele. Tem outros, mas vamos a ele primeiro.

Inside Jaws, em seus sete episódios de aproximadamente 30 minutos cada, me levou por caminhos que não esperava, pois, ao começar a ouvir, acreditei que seria mais como um ‘por trás das câmeras’ apenas do filme. Entretanto, não foi só isso que encontrei. Fiquei conhecendo um pouco mais de Spielberg pois Mark Ramsey – o criador, produtor, narrador e dublador de todas as vozes do podcast – nos conta muito sobre a vida do diretor desde sua infância até chegar a como o filme foi realizado, suas alegrias e tristezas, facilidades e dificuldades (muito maiores do que as facilidades).

Com bons efeitos sonoros e uma narrativa que nos leva para dentro da ação (isso está parecendo coisa de trailer de filme), o podcast me cativou deste o comecinho. Em formato de contação de história, Mark nos apresenta histórias reais da produção e histórias reais de ataques de tubarões que inspiraram Peter Benchley a escrever o livro que deu origem ao filme. Ah, Peter Benchley também foi, junto com Carl Gottlieb, o roteirista do filme. Tem histórias muito legais de Carl e sua interação com Steven Spielberg enquanto tinham que escrever e reescrever cenas enquanto problemas de filmagem se acumulavam em uma cidadezinha na costa do estado de Massachusetts.

O apresentador conta histórias de alguns atores, suas alegrias e desavenças durante e depois do filme já pronto. Conta das decepções por causa dos Oscares que não vieram e do que veio por causa da trilha sonora. Que trilha sonora! John Williams, mestre supremo, recebeu seu primeiro Oscar de trilha sonora original por ela. Engraçado que Spielberg, ao ser apresentado ao tema principal, achou que John estava brincando. Quando John falou que a ideia era aquela mesmo, Stephen levou a sério, mesmo duvidando. O resto é história, quer dizer, música que entrou para a história.

Um dos momentos que mais me chamaram a atenção no podcast tem a ver com Quint, o personagem vivido por Robert Shaw. Quint é um pescador e um homem difícil de se lidar. Misterioso, ninguém conhece o seu passado. Robert Shaw, bêbado em algumas cenas, passa uma veracidade impressionante de o quanto Quint se esconde por baixo da máscara de durão, sem deixar que a verdade venha à superfície. Sabemos que algo navega por baixo das águas turbulentas de sua vida, mas o que é? Para os que não assistiram o filme ainda e querem assisti-lo, sugiro não procurar nada sobre desastres de navios durante a Segunda Grande Guerra. Bom, não quero falar muito mais nem sobre o podcast, nem sobre o filme para não dar spoilers (acho que já dei um, mas será que falar de filmes que têm mais de 25 anos pode ser considerado spoiler?). Apenas digo: ouçam o podcast; assistam o filme. Não necessariamente nessa ordem. Ambos valem, muito, o seu tempo. Apenas lembrem, o filme é de 1975. Assistam com isso em mente e tentem estar naquele ano, mergulhando com cuidado nas águas assustadoras de Amity Island (cidade fictícia da história), em algum lugar nos arredores de Massachusetts.

Ao terminar de ouvir Inside Jaws eu sabia que iria escrever algo sobre ele, só que não poderia ser naquele momento. Outros já estavam na fila. Vida que seguia.

Alguns meses depois, no feed de Inside Jaws apareceu uma propaganda de um outro podcast do mesmo apresentador, Mark Ramsey: People Like Us: Inside Philadelphia. (Pessoas como nós: Por dentro de Philadelphia). Ouvi e me emocionei profundamente. Mas pensei: caramba, esse aqui eu não sei se daria pra indicar num PS, é muito pequeno, só dois episódios. Talvez sim, pensei. Talvez não. Deixei pra lá. Acabei me esquecendo dele.

“Eu tenho amigos neste mundo
Meus amigos estiveram comigo
Desde quando éramos meninos e meninas
E segredos foram revelados”

Quando eu era criança, um de meus primos mais velhos – não tão mais velho que eu – tinha um livro que usou para a escola de inglês que fazia. Por algum motivo que não me recordo agora, esse livro veio parar em minhas mãos. O livro contava a história do filme Tubarão (ou seria Tubarão 2? Não tenho certeza absoluta). Era ilustrado com fotos do próprio filme. Só que eu só lembrei disso quando, aproximadamente um mês atrás, decidi finalmente escrever sobre Inside Jaws. Antes de escrever, entretanto, quis assistir o filme. Ao assisti-lo, percebi que conhecia muito da história, mas realmente não consegui me lembrar se já tinha assistido antes. É engraçado lembrar de coisas assim, “do nada” e também de perceber que esquecemos muito facilmente das coisas. Então me perguntei: por que esquecemos? E, mesmo sendo estimulados, como é que conseguimos lembrar de algo assim, que ninguém mais poderia lembrar? De onde vêm essas lembranças? Onde ficam armazenadas? Mas já estou divagando novamente...

Nesse entremeio, há alguns meses, mas bem depois de ouvir Inside Jaws e People Like Us: Inside Philadelphia, Mark Ramsey lançou um novo podcast no mesmo estilo dos outros dois. Dessa vez sobre um filme, ou melhor, sobre uma saga que marcou e influenciou (ainda influencia) a vida de muitos ao redor do mundo. Inside Star Wars. (Por dentro de Guerra nas Estrelas). Assim que eu vi, ou seja, antes de ouvir, o novo podcast decidi: vou escrever sobre os dois juntos, unir Tubarão e Guerra nas Estrelas. Negócio fechado.

Claro que recomendo enormemente ambos os podcasts. Se gostam de saber histórias de bastidores da produção, dos atores, autores, produtores e ‘otras cositas más’ ligadas a essas duas obras, estes são dois podcasts imperdíveis.

Inside Star Wars tem 7 episódios e fala sobre Guerra nas Estrelas, George Lucas, Carrie Fisher, Harrison Ford, Mark Hamill, Peter Cushing e Alec Guiness, além, é claro de R2-D2 e C3PO e muitas outras pessoas envolvidas na produção e na vida do Senhor Lucas. O podcast termina – como acontece no Inside Jaws – com um episódio bônus em que Mark entrevista alguém que conhece um pouco mais do filme ou das pessoas envolvidas nele. Em Inside Star Wars, ele entrevista Brian Jay Jones, biógrafo de George Lucas e em Inside Jaws ele entrevista Carl Gottlieb, um dos roteiristas do filme.

Terminei, mas a caminhada ainda estava acontecendo e a estrada, apesar de aparente clara em minha mente, iria me proporcionar surpresas e canseiras. Ou seja, a hora de escrever ainda não tinha chegado. Sigamos caminhando.

“Eu caminhei na avenida até minhas pernas parecerem pedras
Eu ouvi vozes de amigos, desaparecidos e que se foram
À noite eu conseguia ouvir o sangue em minhas veias
Ele estava tão negro e sussurrante quanto a chuva
Nas ruas da Philadelphia”

Foi aí que eu pensei: se Mark Ramsey gravou esses dois “Inside”, quando ele vai fazer o próximo? E qual será o filme? Fui atrás de saber. Surpresa. Descobri que ele já tinha feito não apenas um, mas dois outros no mesmo estilo, sobre dois outros filmes clássicos em Hollywood. Inside Psycho e Inside The Exorcist, um sobre Psicose e o outro sobre O Exorcista. O que eu fiz? Decidi ouvir ambos e isso me fez mudar, mais uma vez, o que eu iria escrever.

Naquele exato momento decidi que iria escrever sobre os quatro “Inside”. Histórias intrigantes sobre filmes excelentes e que impactaram profundamente a história cinematográfica mundial (mesmo que alguns achem que possam estar datados). Só que, como falar de quatro filmes clássicos e, além disso, falar de quatro podcasts relacionados a eles pode tornar esse episódio longo demais (já está, eu sei), vou falar algo sobre cada um, mas de forma reduzida.

Por ordem de lançamento dos filmes, cito algo que me chamou a atenção em cada um desses “Inside”:

Psicose (Psycho, 1960) mudou como as pessoas passaram a ir ao cinema para assistir filmes. Antes dele, o público entrava na sala de projeção com os filmes rolando e não havia essa preocupação de assistir o filme a partir do começo. Eu mesmo, e muita gente que eu conhecia, muitos anos depois em Natal ainda fazia isso. Chegávamos e o filme já estava passando e entrávamos mesmo assim, sem nenhum grande problema. Foi Alfred Hitchcock que fez questão de falar para as pessoas – inclusive com cartazes com ele em tamanho natural – que elas não poderiam entrar no cinema se o filme já tivesse começado pois a experiência de assistir Psicose dependia de assisti-lo desde o início. Também pedia àqueles que já tinham assistido para não contar sobre a grande virada da história. Será que foi o primeiro grande plot twist do cinema?

O Exorcista (The Exorcist, 1973) transformou a história dos filmes de terror e o que era mostrado nas telas para o grande público. Filme com muitas controvérsias, trouxe uma atriz mirim – Linda Blair, na época com 14 anos – que participou de cenas extremamente gráficas com palavras e gestos obscenos. Foi tão perturbador que existem inúmeros relatos sobre pessoas passando mal, vomitando e desmaiando durante as cenas mais fortes do filme. Também fez tanto sucesso que filas se formaram para assisti-lo, apesar de toda a controvérsia que ele causou (foi chamado, à época, de pornografia religiosa, para citar apenas uma delas).

Tubarão (Jaws, 1975) foi o primeiro grande sucesso comercial que gerou filas e filas e mais filas, tornando-se o primeiro filme digno de ser chamado de blockbuster, quebrando recordes de bilheteria até então e de, ainda hoje, contando com ajuste de inflação, permanecer entre os 10 filmes que mais arrecadaram em toda a história. E, por fim,

Guerra nas Estrelas (Star Wars, 1977). Isso mesmo, Guerra nas Estrelas. Apesar de hoje em dia todo mundo só se referir a ele como Star Wars, Uma Nova Esperança, como diz uma grande amiga minha, para mim, ele será sempre, apenas, Guerra nas Estrelas. A obra, muito maior do que apenas um filme, torna-se um marco para tudo o que viria depois dele. Quando ele estreia, nada que tinha sido feito antes poderia se comparar ao sucesso que ele se tornou. Vemos reflexo disso até hoje. Supera Tubarão na bilheteria e faz George Lucas ser um dos maiores criadores de Hollywood de todos os tempos. Adoro, no podcast, como ficamos sabendo mais sobre ele e alguns dos atores, como quando conhecemos mais a respeito da doçura de Peter Cushing, o ator que representa o Governador Tarkin, um dos vilões mais marcantes da história da franquia.

E assim, terminamos... Não, ainda não.

“Cidade do amor fraternal
Lugar que chamo de lar
Não vire suas costas pra mim
Eu não quero ficar sozinho”

E quanto ao outro podcast de Mark Ramsey? Será que eu realmente não iria falar sobre ele? Decidi pelo contrário.

Foi aí que, ao terminar de ouvir os cinco podcasts e de assistir três dos cinco filmes (Tubarão, Psicose e O Exorcista), eu decidi reouvir e redescobrir People Like Us: Inside Philadelphia.

“O amor dura para sempre”

Philadelphia, o filme, saiu em 1993. Lembro de tê-lo assistido na época e de tê-lo amado. Estava eu por volta dos meus 20 anos, ainda, naturalmente, aprendendo a viver; coisa que continuo a fazer hoje e espero seguir fazendo pelo resto de meus dias. Só que, como você que me acompanha já sabe e está – literalmente cansado de saber – minha memória não é lá essas coisas todas, então, muita coisa ficou lá, bem longe, naquele 1993 ou 1994, em Natal.

Ora, se eu não consegui lembrar que já tinha ouvido os dois episódios de People Like Us, como lembraria do filme? À medida que recomecei a ouvir o podcast, entretanto, a música do Boss – não, não aquele que está lhe vigiando agora – trouxe muita coisa de volta à mente. Falo de Streets of Philadelphia, de Bruce Springsteen, também conhecido como The Boss.

Disse recentemente a um amigo – espero poder um dia conhecê-lo pessoalmente, Bruno – que quando penso nessa música tenho sempre a sensação de ela ser “gigante, como se tivesse uns 10 minutos. Mas ela é extremamente curta para os padrões convencionais. Não sei se é o que ela me faz pensar e sentir que faz com que ela seja muito longa em minha mente.” Talvez isso se dê pelo fato de que ela “fica comigo” mesmo depois que acaba. Fica repetindo internamente, como o pensamento de quem está “condenado por ter AIDS” ou com algum problema que o leva a pensar que certamente vai morrer em breve. Era isso o que sentiam todos aqueles que contraíram a doença naquela época sombria do final dos anos 80s e anos 90s.

Lembro que quando ouvi People Like Us pela primeira vez, fiquei com essa música em loop no carro por pelo menos uns 30 minutos. Sim, eu sou um pouco obsessivo. J Mas, mesmo assim, como já falei antes, esqueci totalmente dele. Tanto que quando o encontrei na minha lista de podcasts já ouvidos me perguntei: eu já ouvi esse podcast antes?

Ouvi sim. Assim que (re)começo a ouvi-lo, como que uma enxurrada de lembranças e emoções voltam correndo para mim.

Lembrei da história inicial, de Connie Mudenda e sua família na Zâmbia. Ela tinha AIDS e na sua época, ter AIDS, ser HIV positivo, era uma sentença de morte. Lembrei também da história sobre Rock Hudson, um dos maiores atores galãs de sua geração, que também adquiriu a doença e morreu alguns meses depois de anunciar que a tinha contraído. Eu lembro dessa história, não apenas por causa do podcast. Dessa eu lembro de conhecer quando acontecia e era anunciada nos jornais.

Lembro que me emocionei ao descobrir que o diretor – Jonathan Demme – empregou por volta de 60 pessoas que tinham AIDS no filme e que apenas três anos depois do filme ser lançado em 1993, a maioria já tinha morrido. Hoje, com exceção de uma, apenas uma, todas as outras já morreram desde que o filme foi lançado, apenas 25 anos atrás. Um deles, inclusive, morreu antes de o filme estar pronto. Mas ele conseguiu assisti-lo antes de partir. Jonathan, sabendo que o ator Mark Sorensen estava em seus momentos finais, entregou uma fita com o filme ainda inacabado na casa dele. Mark assistiu e adorou, emocionado. Morreu no dia seguinte.

“Nenhum anjo irá me receber

Somos apenas eu e você, meu amigo

E minhas roupas já não me cabem mais

Eu caminhei mil milhas

Só para sair dessa pele”

Cada um de nós sabe das dificuldades e facilidades de ser quem se é. Quando olhamos de fora, normalmente, vemos um estereótipo, uma imagem, um sexo, uma cor. Quanto tempo ainda levaremos para aprender a ver?

Uma das outras histórias contadas no podcast nos mostra o poder da arte sobre a vida real. No final do primeiro episódio da série, ele cita, como falei antes, que hoje, apenas uma das pessoas com HIV positivo que trabalharam no filme está viva. Ele conta parte da história dessa pessoa comum, alguém como nós.

Trabalhando em um banco, antes de sua participação no filme, ficamos conhecendo um episódio na vida dela. Alguns de seus colegas de banco, ao descobrirem que ela tem AIDS, pedem para mudar de mesa pois estão com medo de permanecer perto dela e contrair a doença. Ela, sozinha, apenas observa e, não pela primeira vez naquele dia, chora.

Quem de nós não se sentiria dessa mesma maneira? Quem não quereria se despir dessa pele que aparentemente somos? Quem, no final das contas permaneceria realmente nosso amigo?

Talvez, entretanto, a pergunta mais importante seria: permaneceríamos amigos de alguém que passasse por algo assim? Conseguiríamos superar o trauma, o preconceito, o prejulgamento que vinha (será que ainda não vem?) com doenças ou coisas semelhantes que vivemos ainda hoje?

Será que, como nos diz Neil Young em um trecho de sua música Philadelphia que concorreu ao Oscar de melhor música original, mas não levou, nos envergonharíamos do amor que tínhamos pelo nosso amigo ou amiga que tinha a doença:

“Alguém está falando comigo

Chamando meu nome

Me diga que a culpa não é minha

Eu não me envergonharei do amor”

Para mim, esse foi um dos tons que Jonathan Demme quis passar com o filme. Guardadas as devidas proporções, também senti que Mark Ramsey conseguiu passar a mesma compaixão com o seu podcast. Nos dias de hoje, a batalha contra a AIDS ainda não foi vencida, apesar de aparentemente estar estabilizada. Os coquetéis antivirais auxiliam na sobrevida dos pacientes e reduzem, em muito, a possibilidade de transmissão da doença, que acontece principalmente por contato sexual sem proteção adequada, através do sangue e pelo leite materno.

No momento em que me aproximo de terminar de produzir o texto desse episódio, descubro que uma organização não governamental publicou um estudo que mais da metade dos doentes ainda não diagnosticados oficialmente com AIDS nos Estados Unidos da América estão localizados no sudeste do país. Isso se dá, de acordo com a percepção sobre os dados analisados, ainda por causa do medo e preconceito com relação ao se descobrir infectado. Isso acaba levando as pessoas a não buscarem saber se estão infectadas e isso acaba não apenas protelando o tratamento e a melhora do paciente, mas também ajudando a aumentar o número de pessoas que se contaminam.

“A noite já caiu e estou deitado, acordado
Eu me sinto desaparecendo
Então, me receba meu irmão, com seu beijo infiel
Ou será que nos deixaremos sozinhos, assim
Nas ruas da Philadelphia?”

Ainda tem mais coisa para falar sobre esse podcast de dois episódios? Tem. Eu vou falar? Não, não vou falar mais. Apesar de a vontade ser de continuar conversando sobre ele, creio que boa parte do que queria relatar já falei aqui. Talvez tenha falado mais do que devia, inclusive.

Eu sou você que me escuta agora. E, depois de ouvir e reouvir o podcast e reassistir o filme, tenho mais certeza disso. Eu e você, você e eu são pessoas como nós.

Somos amadores. Profissionais. Pessoas que desgostam, são desgostadas e dão desgostos também. Temos, contraímos e passamos doenças. Somos pequenos, pequenos gigantes. Somos menos do que alguns acham e mais do que jamais imaginamos que podemos ser.

Somos, somamos.

“Algumas vezes eu acho que sei
O que realmente é o amor
E quando eu vejo a luz
Sei que ficarei bem”

Não sei o que é o amor. Só sei que é ele que me faz seguir. O amor que tenho e que recebo. De você e dos meus. Sei também que se não o repartir, dividir, distribuir, entregar, compartilhar com os outros, ele diminui, por mais paradoxal que isso possa parecer.

Hoje, depois de muito tempo tentando fazer com que esse texto pudesse ser escrito, creio que consegui ver a luz – pelo menos parcialmente – pois sei que ficarei bem.

Espero que você tenha permanecido comigo até agora, fiel ou infiel. Que suas pernas não estejam cansadas, como pedras. Que seu sangue esteja circulando, vermelho, vivo e gritando ao mundo: estou vivo, sou vivo, quero viver e viver para amar!

Vivamos!

Viva! Viva!

P.s.: Ainda teria muito mais que falar e conversar, não apenas sobre People Like Us mas também sobre todos os podcasts e filmes citados. Caso queira falar, perguntar, criticar, comentar, por favor, sinta-se à vontade de deixar uma mensagem no site do Iradex ou em qualquer das redes sociais em que o Iradex tem conta. Ficarei feliz em saber que estamos conectados.

P.s.2: Quando decidi que iria escrever sobre Tubarão (Jaws) e Guerra nas Estrelas (Star Wars), encontrei, não lembro como, um livro de cartuns e histórias em quadrinhos de Will Eisner que se chama Star Jaws e foi publicado em 1978. Não é o melhor livro que já li, nem o mais engraçado, mas é um importante documento de sua época. A existência desse livro mostra o quanto ambos os filmes foram importantes para o desenvolvimento do cinema blockbuster que temos hoje.

P.s.3: Aos amigos Gustavo Mociaro – nosso Gusta – e Bruno Garcia, vulgo Garvas, quero agradecer do fundo do coração à coragem de me emprestarem suas vozes para participarem de algo que não sabiam o que seria. Além disso, quão incrível é o desprendimento de vocês ao darem a cara (a voz) a tapa para falar textos de duas lendas do rock mundial. A voz de Gusta é a que fez a música Philadelphia de Neil Young, citada no texto e Bruno fez você ouvir Streets of Philadelphia de Bruce Springsteen, que ganhou o Oscar de melhor música daquele ano de 1994. Elas concorreram juntas e ao receber o prêmio Bruce disse, após uma piadinha inicial, “Neil, eu tenho que compartilhar isso com você! (e levanta a estátua)”. Nada mais justo. Ambas as músicas são excepcionais e dentro do filme, ainda mais. Kaio Anderson, ninguém ouviu sua voz nesse episódio. Apenas eu. Muito obrigado também, cara!


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