Primeiros Segundos #7 - De volta para casa? | Iradex

Primeiros Segundos #7 - De volta para casa?

Fazer amigos pela vizinhança é uma grande responsabilidade, principalmente quando precisamos voltar pra casa. Voltar pra casa, aliás, é o que estou fazendo enquanto penso nessas palavras.

O problema é que nem sempre esse retorno é um alívio. E é justamente esse o tema da indicação de hoje.

Não. Não é sobre o Cabeça de Teia.

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Texto, locução e edição por Mackenzie Melo. Edição complementar por Roberto Rudiney.


De volta para casa? (versão em texto)

Olha só. Já fui e já voltei. Comecei e recomecei e ainda não consegui achar a maneira certa de escrever o primeiro texto dessa coluna. De outras vezes culpei o pessoal da RIPA – e continuo achando que eles poderiam me dar um folga e mudar o tema que eles querem que eu escreva – mas hoje só posso culpar a mim mesmo. E já vou avisando logo: sei que pelo menos mais dois textos sairão antes do primeiro. Espero que a RIPA não leia isso.

Por que culpar a mim mesmo dessa vez? É que, voltando para casa um dia desses, descobri que um podcast que queria muito ouvir a segunda temporada estava prestes voltar. Voltou. E, agora que escrevo, já acabou novamente. Homecoming é o podcast da vez.

Morando nos Estados Unidos, mas sendo brasileiro, muitas das coisas que ouço no meu dia a dia, mesmo já convivendo com a língua inglesa há algum tempo, me soam estranhas pois ainda me faltam muitas referências culturais. Essa é a magia da linguagem. A pessoa pode traduzir algo literalmente ou procurar uma expressão semelhante que se aproxime do sentido original que queria ser dito, mas mesmo assim, ainda parece faltar algo que fica perdido na tradução, na adaptação.

Um exemplo onde, creio, fica fácil de perceber isso é na nossa Festa Junina. Se fôssemos traduzir para o inglês – ou, na verdade, para quase qualquer idioma – seria indispensável uma nota de rodapé explicando o que é essa celebração. Literalmente, se pensamos apenas nas palavras em Português, Festa Junina seria uma festa em Junho. Entretanto, todos sabemos que não é isso. Ou melhor, é isso também, mas é muito mais que apenas uma festa que acontece no mês de Junho.

Homecoming é uma dessas palavras, dessas expressões. Apesar de poder ser traduzida como “de volta ao lar” – como no filme mais recente do cabeça de teia – nós perdemos uma referência cultural básica para entender o que significa homecoming. Minha sugestão, então, é que leiam pelo menos a página da wikipedia a respeito dessa celebração para poder entender que o sentido da palavra é mais amplo que a tradução literal é capaz de englobar.

Depois de dito tudo isso, entretanto, preciso confessar. O podcast que cito hoje não diz respeito a essa celebração especial chamada ‘homecoming’ que é uma tradição em escolas e universidades nos Estados Unidos, como no filme do Homem-Aranha.

Homecoming, o podcast, se utiliza da definição direta da palavra, ou seja, ‘retorno ao lar’. Essa expressão é utilizada pelos militares americanos quando são recepcionados ao voltar de suas missões longe de casa, especialmente, quando fora de seu próprio país. Essa é parte da temática com a qual o áudio-drama Homecoming trata.

Estar de volta em casa, para muitos dos soldados, é, na verdade algo muito distante disso. Lidar com a falta do barulho da guerra; com a ‘família’ que deixaram para trás no terreno de combate; com a abstinência emocional que a tensão constante viciou a mente e o organismo, dentre muitos outros problemas, torna esse retorno algo insuportável para muitos. É um problema tão sério que muitos acabam perdendo a família, se entregando a vícios diversos, adquirem depressão, síndrome do pânico e, em casos infelizmente não tão raros, terminam por cometer suicídio. Muitos soldados ficam, portanto, impossibilitados de serem soldados novamente.

É com base nesse background, que a série, quase um estudo psicológico de personagens, acompanha a trajetória de Heidi (Catherine Keener – Sendo John Malkvich e Capote) tentando tratar Walter Cruz (Oscar Isaac – Ex Machina e Star Wars: O Despertar da Força) de seus traumas e problemas quando ele retorna da guerra. O programa governamental secreto intitulado Homecoming, supostamente criado para ajudar esses soldados a se readaptarem à vida social, está envolto em práticas e métodos questionáveis na tentativa de fazer isso.

Nos primeiros minutos em que tomamos contato com a personagem principal da trama, percebemos que Heidi é uma terapeuta empática que deseja, realmente, saber mais sobre seus pacientes para poder ajudá-los da melhor maneira possível. Entretanto, nos perdemos rapidamente quando, em um salto no tempo, a vemos como garçonete em um bar e parecendo muito diferente da Heidi que acabamos de conhecer.

O que aconteceu com ela? Por que tem um investigador atrás dela? E Walter, o paciente que ela trata, por onde anda? Quem está por trás desse programa e qual é o objetivo real dele? Quem é Colin Belfast (David Schwimmer – Ross, de Friends), o seu chefe abusivo e instável?

Será que Walter volta à sua casa? De que casa estamos falando? Casa física ou algo diferente disso, como quando Dorothy nos faz pensar em o Mágico de Oz “não há lugar melhor do que a nossa casa”.

Teorias da conspiração, problemas com a indústria farmacêutica e distúrbios psicológicos são temas tão atuais que a história parece estar acontecendo de verdade em uma esquina bem perto de nós. Até porque a sutileza com que os criadores utilizam os sons e as vozes dos atores para representar os locais e os sentimentos que eles vivem, os trazem para nosso lado, quase para dentro de nós, como num sussurro gritado ao pé do ouvido.

Homecoming é um podcast produzido pela Gimlet Media e, até a escrita desse texto, contava com duas temporadas encerradas (12 episódios no total). Na segunda temporada eles lançaram um pequeno livro dividido em seis capítulos para ser lido junto com cada episódio dessa temporada. Vale dizer que a leitura do livro não é obrigatória, mas adiciona conteúdo à história. E, como última informação, o podcast foi comprado pela Amazon e terá Julia Roberts no papel principal da adaptação.

P.s.: escutar esse podcast antes de ver a série poderá ser a nossa chance de dizer a todos que vieram nos indicá-la: “Ah, eu conheço. Já ouvi o podcast. É massa!” Podem dizer também que ouviram falar aqui na RIPA sobre ele. Me ajudará bastante com os donos dessa casa.


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