Sem Título | Iradex

Sem Título

Nomes são bastante comuns. Todos tem, mas poucos realmente o escolheram. O que faz o verdadeiro nome? Cada um tem seu caminho, cada um tem o seu tempo. Nomes se revelam aos que os desejam e esperam. Até la, somos todos sem nomes.

Sem Título é um conto escrito por Miguel "O Legalzão" Arcanjo, distribuído em primeira mão aqui no Contos Iradex.


Sem Título

No começo, não havia o meu Nome. A maioria das pessoas vive toda a vida e não se importa com isso. Algumas conseguem seus nomes e outras não. Isso importava pra mim, eu queria ter meu nome.

E meu nome veio até mim, não o criei, não o escolhi. O nome estava lá esse tempo todo e eu só precisei ver.

Para ter o seu real nome é preciso algo mais. Nomes são como quebra cabeças, basta perguntar a qualquer pessoa que tem um cachorro. Ele nunca vem fácil.

O meu nome, para se anunciar ao mundo, precisou de uma longa progressão de acontecimentos, iniciando-se quando eu li "O Nome do Vento". Foi nesse livro que fui apresentado a esse conceito. O livro conta a história de Kvothe, um garoto que faz parte de uma trupe itinerante que, ao encontrar-se com um sábio, aprende sobre a arte da Nomeação, cresce fascinado com nomes, e sonha em descobrir o real Nome do vento, não esse que demos a ele. Ao ler esse livro eu passei a questionar o nome de todas as coisas, tudo no mundo tem um nome real. Nós só as chamamos pelo nome que damos a elas.

Nesse momento eu passei a ser uma pessoa inquieta. Como viver sabendo que até eu mesmo tenho um nome que não é meu?

A vida encontra um meio, sempre, e os meses após essa pergunta nascer foram os mais caóticos existentes. Meus sentimentos cantavam para alguém que estava ouvindo sua música, mas deturpava e interpretava de maneira errada. Eu não tinha espaço para pensar no meu Nome, eu sofria. Reli O Nome do Vento e, no desejo deem encontrar o nome, ganhei forças para me recompor, e num círculo perfeito, usei essas forças para encontrar.

Enquanto eu não achava esse nome, eu usava nas redes sociais o apelido "Uncool", inspirado pela obra de Cameron Crowe, diretor de Quase Famosos, que é um dos meus filmes preferidos. O nome era usado no filme para representar aquela pessoa que era diferente das outras, que ouvia música diferente e consumia cultura que poucos consumiam, como o protagonista William Miller. Enquanto eu fazia isso, meus sentimentos já se recuperavam da dor e voltavam a cantar, mas não a cantar para alguém, eles cantavam para tudo e todos. E eu comecei a vagar pela cidade, indo a cantos que eu não ia, conhecer pessoas, conhecer suas histórias e desse jeito descobrir partes de mim que eu antes não conhecia.

Enquanto isso acontecia, a vida colocava para tocar "Pelados em Santos" do Mamonas Assassinas em vários momentos aleatórios.

Seguindo a história, enquanto eu conhecia pessoas acabei por conhecer uma garota que tomava remédios controlados e tinha histórico de tentativas de suicídio. Nos conhecemos mais e eu aprendi muito com ela, que sempre buscava ter uma visão melhor do mundo mas acabava tendo uma visão trágica, e ao juntar essas duas características acaba resultando em uma visão poética do mundo e da vida. Eu a ajudei muito, e ela muito me ajudou. Fomos bons amigos. Muitas vezes ela me agradecia por te-la ajudado. A vida passou e nos afastamos.

Isso se repetia conforme eu me aproximava e conhecia pessoas novas. Sempre recebia agradecimentos por ajudá-las, seja com algo palpável ou compartilhando da minha visão mais esperançosa de quem quer mudar o mundo com palavras. Eu notava que ao sair buscando por aventuras eu acabava ajudando as pessoas e, nossa, como isso me fazia bem. Não existe na vida nada melhor do que ver alguém que outrora te olhava chorando, olhar pra você sorrindo e agradecendo a você por ter ajudado aquele sorriso aparecer.

Eu havia me tornado uma pessoa melhor na minha busca por meu Nome.

Outra vez tocou Pelados em Santos e, pensando em tudo isso que havia acontecido comigo, eu escuto o trecho "Pois você, minha pitchula, Me deixou Legalzão". Foi aí que eu cliquei e vi que meu nome escolheu essa música para se apresentar a mim.

Desse dia em diante eu seria o Legalzão, afinal, nada mais justo.

A busca pelo meu nome me fez ser uma pessoa melhor. Legalzão é um nome que me levaria a sempre buscar ser uma pessoa melhor. Não sendo perfeito, pois ninguém é, e sabendo que nunca serei, devo pelo menos tentar ser Legalzão.

A história nunca tira seus olhos de nós, e nós não temos controle sobre quem vai contá-la, então eu sigo eu em busca, dia após dia, de fazer a minha história e a das outras pessoas a mais legal possível, para que quando foram contadas, sirvam a um propósito maior.


Esse conto foi escrito por Miguel "O Legalzão" Arcanjo para o Contos Iradex. Para reprodução ou qualquer assunto de copyright o autor e o blog deverão ser consultados.


Sobre o autor: Miguel de batismo. Legalzão por escolha. A versão humana de um Basset-Hound. Sendo água e vivendo de 20 em 20 segundos de coragem, procura tirar da monotonia diária, pequenas porções de bondade e poesia.
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